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Dentro Do Segredo (2012)

by José Luís Peixoto(Favorite Author)
3.73 of 5 Votes: 3
ISBN
9897220607 (ISBN13: 9789897220609)
languge
English
genre
publisher
Quetzal
review 1: Terceiro livro terminado da minha lista de leitura de obras publicadas sobre a Coreia do Norte. Os dois primeiros, "Nothing to Envy" e "Escape From Camp 14" foram escritos por jornalistas (norte-americanos) e relatam a vida, a fuga e o exílio de cidadãos normais (Barbara Demick) e de um infeliz que nasceu e era suposto morrer num campo de concentração (Blaine Harden).Trata-se de um sólido, útil e relevante livro de viagens de um excelente escritor com valores literários claramente elevados (não um jornalista, o que se percebe em cada página; o estilo irritou-me um pouco, por vezes). Mesmo condicionado pela omnipresença de dois guias e um percurso "turístico" imposto com poucas hipóteses de flexibilização, é uma obra cheia de observações pertinentes que enr... moreiqueceu muito o relato dos outros livros e cuja leitura durante dois dias de férias na Praia de Rodas, foi um prazer compulsivo.Portanto, estou agradecido a José Luís Peixoto por ter concretizado o desejo de ir à Coreia do Norte por ocasião do centenário do pai da nação e por depois ter escrito o que viveu nesses dias de descoberta. Não será Paul Theroux, mas não está nada mal."Nessas páginas, em todas as fotografias, o falecido Kim Jong-il surgia com o seu filho e sucessor, Kim Jong-un. Apesar de parecerem estar apenas a olhar para objectos inusitados em fábricas e locais de trabalho, muitas vezes com ar de perplexidade, a legenda repetia que estavam a dar orientação nas mais variadas áreas..." Procurar no Google pelos tumblr "Kim Jong-il looking at things" e "Kim Jong-un looking at things", vale bem a pena."Sem sorrir, com ar sério, a menina Kim disse que estava bom tempo porque se aproximava o aniversário do grande líder.""Ao peito de homens e mulheres, o emblema com a cara de Kim Il-sung, Kim Jong-il, ou de ambos.""Todas as flores em exposição eram kimilsungias ou kimjongilias."E etc. Ou seja: a ficção tem muito que aprender com a realidade.Quanto a referências."Já no quarto, à janela, passando o olhar sobre Pyongyang, duvidava de tudo. Às vezes, pensava: O que faço eu aqui? Essa pergunta vinha tão de dentro de mim que o seu caminho feria-me." Uma pergunta e um dilema clássicos do viajante. A última vez que a li antes deste livro foi no "The Last Train to Zona Verde", sobre o périplo de Paul Theroux em Angola (e outros países, mas sobretudo Angola): "Walking around this compound in the early morning saddened me and made me impatient. With the sun striking from above the tall grass, the heat took hold, and I had the fugitive thought again: What am I doing here?" "Where am I?, I thought. Nothing to do on the Day of the Defunct except walk around this high sloping city, reflecting on my trip. What am I doing here? Lubango lay sprawled across a plateau at almost six thousand feet. The weather was pleasant now, in November, but in the Angolan winter of July and August — so the locals complained — it was cold enough in this region for people to wear heavy coats, and some days frost crystals had to be scraped from windows and windshields." "I had risen in the darkness of the hotel. I waited in the darkness and stink of the bus station parking lot. A feeble rubious hint of morning light bled sideways into the sky, each puddling bit of brightness making the place look uglier with sharpened details of its decrepitude, and the shouting made it worse. What am I doing here?" E há mais, o homem estava mesmo para o desesperado e desesperançado nesta última jornada. Tenho a certeza de que José Luís Peixoto teve fundamentação mais objectiva para esses sentimentos no destino por ele eleito."Nos corredores do metro, havia muitas crianças sozinhas. Com uniforme de saia ou calças azuis escuras, casaco azul-escuro e lenço vermelho de pioneiro, iam tranquilas, dirigiam-se para algum lado. (...) Ainda assim, entre as crianças que vi sozinhas no metro, creio que as mais novas deveriam ter à volta de cinco ou seis anos. Os seus rostos não apresentavam uma mínima sombra de medo. Recordo o quanto isso seria impensável para uma criança normal, com pais, na capital de qualquer um dos países daquelas pessoas que ali estavam de visita." Exactamente! Tudo o que é preciso para garantir segurança e que as crianças conseguem ir para a escola à vontade, sem qualquer problema, é destruir por completo a liberdade e tornar a existência numa coisa perfeitamente insuportável, humilhante e desumana, com muita fome à mistura (e, como se pode constatar na Coreia do Sul, a maior parte da gente até gosta e aplaude, ou pelo menos conforma-se e até acha natural, e visitantes estrangeiros ainda cairão na tentação de lhe dar o benefício da dúvida!). A fórmula é simples e antiga. Patrick Henry, 1775: "What is it that gentlemen wish? What would they have? Is life so dear, or peace so sweet, as to be purchased at the price of chains and slavery? Forbid it, Almighty God! I know not what course others may take; but as for me, give me liberty or give me death!" (Enfim, ele terá dito mais ou menos isto...) E Benjamin Franklin, 1738: "They that can give up essential liberty to purchase a little temporary safety, deserve neither liberty nor safety." (Enfim, ele disse mais ou menos isto...)"Aquilo que me chamou mais a atenção foi a relativa proximidade a que estávamos do extraordinário hotel Ryugyong. Com trezentos e trinta metros de altura, com cento e cinco andares, o hotel Ryugyong é incrivelmente invisível para os norte-coreanos. A menina Kim, por exemplo, enquanto caminhava entre as estátuas do Monumento da Vitoriosa Guerra de Libertação da Pátria, nunca olhou directamente para o hotel Ryugyong que, recordo, estava ali ao lado e chegava ao céu. Após algumas perguntas sobre o hotel, continuou sem olhar para ele, apensas exibiu o seu sorriso mais artificial e disse que estava em construção. (...) Na Coreia do Norte, ninguém quer falar sobre o hotel Ryugyong. Diz-se a palavra e não há logo reacção, a pessoa para quem se está a falar fica à espera, como se não tivesse sido dito nada. Quando a construção do hotel começou em 1987, toda a gente podia falar disso." Aqui, a referência imediata, incontornável é o "The City & The City", de China Miéville, um thriller literalmente fabuloso sobre duas cidades (Beszel e Ul Qoma) de dois países independentes com relações diplomáticas complicadas, e cujo espaço urbano é em grande parte se não "partilhado", certamente "sobreposto". Um pouco como se pode imaginar que seja uma Jerusalém "partilhada" entre israelitas e palestianos. "It was, not surprisingly that day perhaps, hard to observe borders, to see and unsee only what I should, on my way home. I was hemmed in by people not in my city, walking slowly through areas crowded but not crowded in Beszel. I focused on the stones really around me—cathedrals, bars, the brick flourishes of what had been a school—that I had grown up with. I ignored the rest or tried." "It is not uncommon for me to fail to sleep. Sariska and Biszaya were used to sleepily walking from the bedroom to the bathroom to find me reading at the kitchen table, chewing so much gum that I would get sugar blisters (I would not take up smoking again). Or looking over the night city and (inevitably, unseeing but touched by its light) the other city." "They had been accused of furtively propagandising among refugees and new immigrants with limited expertise at seeing and unseeing, at being in one particular city. The activists wanted to weaponise such urban uncertainty." Fascinante ideário e pelos vistos "to unsee" é uma prática concreta, testemunhada por José Luís Peixoto, pelo menos numa forma tentativa, no mundo real."A Zona Desmilitarizada estava cheia de militares. (...) Havia também um sinal de trânsito, sozinho, triste, a indicar que Seul estava a setenta quilómetros." Isto é o tipo de frase (descrição de fronteiras por assim dizer "inter-dimensionais") que desde que li há já uns valentes anos o "Baía dos Tigres" (Angola, de novo) de Pedro Rosa Mendes, me faz sempre lembrar a que se tornou uma das minhas frases favoritas: "Mas o panorama reduzia-se a porcos e galinhas passeando num monte de esterco, meia dúzia de palhotas, algumas ruínas de alvenaria e, ao fundo, na outra margem do Cubango, o Rundu, a Namíbia. Outro país, noutro planeta, a um segundo-luz."E para terminar.Um reflexão importante, excepcionalmente redigida: "Quem diz que a Coreia do Norte é a ditadura comunista mais severa do mundo está errado. Quem diz que é o último reduto do estalinismo está errado. A Coreia do Norte é uma ditadura severa, provavelmente a mais severa do mundo, mas não é comunista. A Coreia do Norte é o último reduto de alguma coisa, muito provavelmente também é o primeiro e único reduto dessa mesma coisa, mas não é estalinista."Um momento zen, do género do Today Show: "Naquela manhã, animado pela brisa fresca, decidi comprar um pacote de bolachas. Foram as primeiras que vi de fabrico norte-coreano, não voltei a ver nenhumas durante todo o tempo que lá estive. Eram caras, mais caras ainda do que as estrangeiras. O rótulo estava colado com fita-cola. Era um pequeno rótulo redondo, feito à mão, com as marcas da tesoura. Imaginei a pessoa que passava dias a fazer esse trabalho. Comi uma única bolacha. Arrependi-me tanto."E depois da Coreia do Norte, a China como bastião de liberdade (ou seja, tudo nesta vida é relativo...): "Despedi-me dos companheiros de viagem que seguiram para Pequim e apressei-me a sair da estação. Atravessar a rua pode ser um prazer imenso. Ninguém atrás de mim, nenhuma vigilância. Não se deve subestimar o valor de respirar fundo. Em Dandong, aproveitei para comer com variedade e, à noite, fui a um bar onde uma banda, com guitarra eléctrica, tocava música pop chinesa."Sim, o sabor inebriante da liberdade, ainda que o preço inclua as crianças não poderem andar à noite em segurança pelas ruas... deste lado da cova, tudo se paga, tudo tem um preço.
review 2: Este livro serviu para confirmar uma realidade que já me parecia óbvia: José Luis Peixoto é, de facto, um grande escritor. Já tinha lido "Morreste-me", uma obra carregada de sentimento, que adorei, mas talvez por ser um pouco "sui generis", queria "vê-lo" noutro registo. Não me arrependei nada.Em Abril de 2012, José Luis Peixoto teve a oportunidade de assistir às exuberantes comemorações do centenário do nascimento de Kim Il-Sung, em Pyongyang, em plena Coreia do Norte. Uma vez aí, participou e fez parte da viagem mais extensa e longa que o governo norte-coreano autorizou nos últimos anos, tendo visitado os mais importantes e nevrálgicos pontos de um regime fechado ao Mundo há mais de 6 séculos. Impressionante a lucidez, a racionalidade e o pragmatismo que o autor adopta ao longo desta impressionante viagem.Não poucas vezes senti-me como se fosse eu próprio que estivesse em Pyongyang, a participar em actividades recreativas ou a presenciar os desfiles militares no meio de coreanos tal o detalhe e a exactidão da sua narrativa.Não sei quando, mas certamente que voltarei a marcar encontro contigo, José Luis. As tuas obras agradam-me sobremaneira less
Reviews (see all)
Dina
Livro mesmo muito interessante sobre uma experiência única na Coreia do Norte.
eigha93
A perfect way to get to know more about North Korea.
Balaji
Boring. Didn't like it much.
Book
Tão, tão bom.
Jackie
meh.
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