Livro: A Trilogia de Nova York (Paul Auster)

FINALMENTE!

Faz quase um mês que não apareço por aqui, mas tenho uma boa desculpa por esse abandono prolongado. Caso não saiba até agora, a pessoa que aqui escreve sofreu um ataque de loucura muito grave três anos atrás e começou o segundo curso universitário. Não bastasse isso ainda decidiu que esse curso seria medicina e é por isso que cá estou, três anos depois e no final do sexto período, exausta por mais uma maratona de provas e com uma lista considerável de posts por escrever. Agora que todas as provas terminaram e finalmente estou de férias vou tentar correr atrás do tempo perdido, escrever esses posts logo e voltar aos meus projetos de filmes, livros e séries.

Para começar os trabalhos, vamos falar desse livro maravilhoso de Paul Auster, um autor que li pela primeira vez.

A primeira vez que escutei falar no livro foi através do canal TLT da Tatiana Feltrin no YouTube. Não prestei muita atenção à resenha em si, mas acabei esbarrando com o nome do livro na listinha dos 1001 livros e decidi que seria interessante dar uma lidinha para ver do que se tratava.

“A Trilogia de Nova York” é, como o nome diz (e eu implico bastante com esse “Nova York” do título porque aprendi na escola que é Nova Iorque ou New York e não se pode misturar essas duas formas…) um compilado de três histórias passadas na cidade, em épocas e contextos diferentes e com diferentes personagens, mas que sempre trazem uma história de investigação/detetives e o oficio de escritor, capitaneada por personagens masculinos. É preciso estar especialmente atento para os poucos momentos em que há referência a uma das outras histórias em meio aos contos, assim como referências bastante sutis a esses personagens que convivem em círculos que raramente se intersectam.

A primeira história é “Cidade de Vidro” traz um escritor de livros de espionagem baratos e sem grande qualidade, como ele mesmo acaba admitindo, que servem apenas para que possa viver com conforto só e recluso, escondendo suas obras sob um pseudônimo. Sabemos pouco desse personagem, a não ser seu nome – Daniel Quinn – e da morte da esposa e do filho pequeno. Isso até os dias em que seu telefone começa a tocar à noite e Quinn, ao atendê-lo, é confundido com um detetive particular. Sem nada melhor para fazer e nenhum assunto que o interesse, Quinn assume a identidade de detetive e é lançado no mistério de um pai e seu filho (tratados pelo mesmo nome – Stillman) e uma estranha história que envolve um experimento social, o uso de palavras como limitante da real natureza humana e, o mais estranho de tudo, a inclusão do próprio autor Paul Auster em sua história. Cada vez mais mergulhado no mistério, Quinn passa a seguir Stillman pai em todas as horas de seu dia e acaba anulando sua própria personalidade no processo, tornando-se não mais que seu desejo de resolução e respostas. Quando se depara com a gravidade de seu erro já é tarde e a espiral de loucura já está avançada demais para que se recue. O conto termina em um final bastante aberto a especulações e serviu para prender minha atenção de modo especial para as duas próximas histórias.

“Fantasmas” traz uma história de que dispomos de ainda menos background que o anterior. Passada em alguma década bem anterior à história anterior, o conto traz Blue como personagem principal de uma trama em que todos parecem ter no sobrenome alguma cor. Blue é um detetive de carreira aparentemente já estabelecida e com uma namorada a quem ama muito, até que é solicitado por um homem chamado White para realizar um trabalho aparentemente muito simples: seguir, anotar e enviar relatórios de todas as atividades de um homem chamado Black. Para isso, Blue se instala em um apartamento de frente ao apartamento de Black e se põe a descrever a rotina bem normal e sem nada demais do escritor que segue pelas janelas. Com um tempo anormalmente grande nas mãos, Blue se pega fazendo algo que nunca fizera antes: pensar sobre a vida e seus sentimentos. A partir de então o próprio proceder de Blue se altera, o que fica claro por seus relatórios. Mesmo quando é “dispensado”, o detetive não consegue se afastar do objeto de interesse que se tona Black, até o momento em que tudo acaba ficando muito claro para ele, ao final. É mais uma história que trata sobre a anulação do eu, conflitos internos não endereçados anteriormente e que ressurgem com força em situações extremas. Essa história tem um certo clima noir e irreal, como de um sonho maluco de muitas transformações.

Em “O Quarto Fechado” temos a narração em primeira pessoa de um crítico literário que nunca conseguiu ter sucesso com a produção de suas próprias histórias, tendo o suficiente apenas para sobreviver. A esposa de um antigo amigo de infância o procura após o desaparecimento do marido e o narrador acaba repensando sobre esse personagem especial que era Fanshawe – alguém que sempre foi motivo de uma enorme admiração e inveja por seus pares. Fanshawe desapareceu sem deixar qualquer traço, deixando a esposa e o filho recém-nascido para trás, além de um quarto repleto de caixas com inúmeros escritos que nunca foram lidos por outra pessoa. Deixou também a instrução de que apenas o amigo de infância teria autorização para ler esses trabalhos e decidir por sua destruição ou publicação. E é isso que acontece, com o narrador creditando o trabalho como muito bom e inovador, agilizando todos os processos relativos à publicação de seus romances e encenação de suas peças, que atingem enorme sucesso. Ao mesmo tempo, esse narrador se envolve com a esposa de Fanshawe e ambos acabam construindo uma família, que vive confortavelmente com a renda dos trabalhos do autor desaparecido. É como se Fanshawe tivesse deixado tudo engatilhado para que esses fatos se desenrolassem exatamente dessa forma e ele fosse substituído sem grandes perdas. Tudo anda pacato e às mil maravilhas até que Fanshawe decide deixar um recadinho para o amigo, fazendo com que este passe a procurar a presença de Fanshawe em todos os lugares. Como temos uma narração em primeira pessoa nessa história, temos um narrador em quem não é possível confiar totalmente e parece muitas vezes que Fanshawe nunca existiu, ou ao menos não existiu como o narrador o percebe, uma figura perfeita mas vazia de intenções e sentimentos humanos. A confrontação de ambos ao final também é outros aspecto que faz suspeitar, assim como os rumores que se apresentam na comunidade de que o narrador tenha mentido em alguns pontos para criar esse personagem misterioso com muitas lacunas na sua história passada.

 

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